O Tribunal Penal Internacional (TPI), com sede em Haia, nos Países Baixos, arquivou a representação da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) que pedia uma investigação contra o presidente brasileiro Jair Bolsonaro por “prática de crime contra a humanidade”, “incitar genocídio”, “promover ataques sistemáticos contra os povos indígenas do Brasil” e “minimizar a gravidade da pandemia de covid-19”.
Abaixo, o despacho na íntegra do procurador Mark P. Dillon, Chefe do Gabinete da Unidade de Informação e Provas do Procurador do TPI. Dillon justifica a decisão da Corte afirmando que não há motivo para acionar a jurisdição do Tribunal Penal Internacional, pois o caso não se enquadra nas definições rigorosas do Estatuto de Roma – instrumento jurídico que norteia a atuação da Corte.
Haia, segunda-feira, 14 de setembro de 2020
Em nome do Procurador, agradeço a comunicação recebida em 28/04/2020, bem como qualquer informação subsequente com ela relacionada.
Como você deve saber, o Tribunal Penal Internacional (“o TPI” ou “o Tribunal”) é regido pelo Estatuto de Roma, que confia ao Tribunal uma jurisdição e mandato muito específicos e cuidadosamente definidos.
Uma característica fundamental do Estatuto de Roma é que o Tribunal só pode exercer jurisdição sobre pessoas para os crimes mais graves que preocupam a comunidade internacional como um todo, nomeadamente genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra. Esses crimes são cuidadosamente definidos no Estatuto de Roma (Artigos 6 a 8) e mais detalhados nos Elementos dos Crimes, adotados pela Assembleia dos Estados Partes.
Com base nas informações disponíveis atualmente, a conduta descrita em sua comunicação não parece se enquadrar nessas definições rigorosas. Consequentemente, como as alegações parecem estar fora da jurisdição do Tribunal, o Promotor confirmou que não há base neste momento para prosseguir com uma análise posterior. As informações que você enviou serão mantidas em nossos arquivos e a decisão de não prosseguir pode ser reconsiderada se novos fatos ou evidências fornecerem uma base razoável para acreditar que um crime dentro da jurisdição do Tribunal foi cometido.
Espero que você compreenda que, com a jurisdição definida do Tribunal, muitas alegações sérias estarão fora do alcance desta instituição. Observo, a esse respeito, que o TPI foi elaborado para complementar, não substituir as jurisdições nacionais. Portanto, se desejar prosseguir com este assunto, você pode considerar levá-lo às autoridades nacionais ou internacionais apropriadas.
Com os melhores cumprimentos,
Mark P. Dillon
Chefe da Unidade de Informação e Evidência
Ministério Público
Post Office Box 19519, 2500 CM Haia, Holanda