Nem São Paulo, nem Rio de Janeiro, tampouco Belo Horizonte. A protagonista das eleições municipais de 2024 tem nome e até apelido: Fortaleza, ou Fortal, como a chamam os mais íntimos. Tradicionalmente, em eleições municipais, SP, Rio e BH são os assuntos principais por serem as capitais dos maiores colégios eleitorais do país. Isso todo mundo já sabe.
Agora, o que surpreendeu a todos este ano foi a capital cearense, que é a maior cidade do Nordeste. A princípio, a listagem de candidatos já chama a atenção. Entre os cinco principais postulantes, dois são de direita (André Fernandes, do PL, e Eduardo Girão, do Novo); dois de esquerda (José Sarto, do PDT, e Evandro Leitão, do PT); e um de centro-direita, o Capitão Wagner, do União Brasil.
De imediato, a guinada à direita já foi um ponto surpreendente na disputa deste ano. Isso porque, se você não sabe, Fortaleza, assim como quase todo o Nordeste, vive sob uma hegemonia da esquerda há décadas. Figuras de centro, como Juraci Magalhães e Antônio Cambraia, ambos do MDB, antigo PMDB, chegaram a revezar o poder, mas isso foi lá atrás, entre 1990 e 2004. Desde então, a capital cearense voltou a ser dominada pela esquerda, com gestões do PT, PSB e PDT, atual sigla no poder.
Pela primeira vez desde o fim do Regime Militar no Brasil, um nome de direita pode assumir a cadeira máxima do Palácio João Brígido. Se levadas em consideração, as principais pesquisas de intenção de voto indicam, até a publicação desta reportagem, que André Fernandes é o favorito para assumir o Paço Municipal. Ele lidera em sondagens como Atlas/Intel, Datafolha, Quaest, Paraná Pesquisas, Futura, Real Time Big Data e Veritá.
Outro ponto que trouxe Fortaleza para o centro das atenções em âmbito nacional, deixando de ser apenas uma disputa regional, foi o tamanho do acirramento entre os candidatos. Desde o início das rodadas de pesquisas, os candidatos do PL, PT, PDT e União performam em empate técnico, dentro da margem de erro. Mesmo André Fernandes, que lidera há diversas rodadas consecutivas, ainda assim continua a pontuar dentro da margem de erro.
O aperto dos números e a forma como os candidatos passaram a se degladiar pela liderança da disputa chamaram a atenção em nível nacional, fazendo com que a capital cearense se destacasse de uma corrida eleitoral convencional e atraísse os olhos do Brasil inteiro para acompanhar esse cenário inédito. Rapidamente, Fortaleza passou a estampar os principais jornais do país, portais, sites e até blogs locais, como em cidades pequenas do Sul e do Sudeste.
Um fator determinante que pode também ter influenciado foi a entrega de conteúdos por parte do algoritmo das redes sociais. Talvez, pelo aumento do interesse nas buscas, as principais plataformas digitais passaram a propagar com mais frequência assuntos sobre os candidatos de Fortaleza.
Em meio a toda essa ascensão, mais um elemento que trouxe resultados foi a desenvoltura dos jingles dos postulantes, especialmente de dois candidatos: André e Sarto. Jingles como “É Culpa do Sarto” e “A Esquerda Tá Desesperada” caíram no gosto dos eleitores, viralizando nas plataformas digitais e rompendo a bolha. Sarto, por sua vez, não ficou de fora. O jingle “Sarto da Juju” grudou na cabeça e viciou até mesmo seus opositores, que começaram a gravar vídeos cantando, independentemente da preferência política. Todos esses sons foram embalados por batidões, em uma mistura de funk, melody, brega, rap e trap.
Mas, além de todos esses pontos já citados acima, o que também tem sido responsável por essa ascensão e protagonismo de Fortaleza em âmbito nacional é a polarização política, que repete o fenômeno nacional de 2022, em uma disputa totalmente antagônica entre esquerda e direita, Lula e Bolsonaro. Não à toa, em agosto, mês que deu abertura ao período oficial das eleições municipais, Jair Bolsonaro deu total prioridade a Fortaleza, iniciando sua agenda política a partir da capital cearense.
O Conexão Política já havia antecipado que a maior aposta do PL em 2024 seria em Fortaleza. Uma grande estrutura foi montada desde o início para dar maior atenção a essa disputa. Lula, por sua vez, não ficou para trás e também passou a priorizar o reduto quando, após uma agenda administrativa federal, fez questão de aderir ao palanque de Evandro Leitão, para sinalizar aproximação e apoio formal a ele na representação local com o PT.
Desde então, Fortaleza saiu do convencional e passou a ser a grande revelação das eleições deste ano, muitas vezes ofuscando a mesmice habitual das tradicionais disputas em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Com a disputa extremamente apertada, todos os indicativos apontam para uma decisão final apenas no segundo turno, uma vez que Fortaleza supera a marca de 200 mil eleitores. Quando isso acontece, toda cidade que não atingir 50% + 1 voto obrigatoriamente passa para uma disputa de segundo turno.
E isso, é claro, vai perpetuar ainda mais o protagonismo da disputa, que pode ser entre qualquer um dos nomes que lideram a corrida. Pode ser novamente entre dois representantes da esquerda, um de centro-direita com alguém da esquerda, um de centro-direita e outro de direita ou, pelo andar da carruagem, um segundo turno marcado pelo que tudo indica: uma disputa entre direita e esquerda, aumentando as chances de a direita sair, pela primeira vez, vencedora de uma disputa histórica e inédita em Fortaleza.