O indiciamento do ministro Juscelino Filho (União-MA) pela Polícia Federal (PF) por supostos desvios de emendas parlamentares para beneficiar áreas onde possui propriedades no Maranhão se soma a outras polêmicas desde que assumiu o cargo.
Segundo as investigações, os desvios teriam sido feitos por meio da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). Juscelino Filho é suspeito de crimes como corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Ele teria usado R$ 10 milhões em emendas para beneficiar sua própria fazenda no estado. A verba teria sido destinada à recuperação e pavimentação de estradas na cidade de Vitorino Freire (MA). O município, sua base eleitoral, tem como prefeita sua irmã, Luanna Rezende (União-MA).
De acordo com a PF, o esquema teria sido realizado em conjunto com uma construtora e um empresário que seria sócio-oculto da empresa. Com base em mensagens trocadas entre o empresário e o ministro, entre 2017 e 2020, a PF concluiu que Juscelino Filho integraria uma “organização criminosa”. No ano passado, o empresário foi preso acusado de pagar propinas a funcionários federais para obter contratos em obras do município.
Em nota ao site Gazeta do Povo, o ministro Juscelino Filho afirmou que a investigação “concentrou-se em criar uma narrativa de culpabilidade perante a opinião pública, com vazamentos seletivos, sem considerar os fatos objetivos”. Ele considerou o indiciamento uma “ação política e previsível” e alegou que a apuração distorceu premissas e ignorou fatos, sem ouvir sua defesa adequadamente.
Juscelino Filho prestou depoimento à PF em maio, defendendo a regularidade da destinação de emendas e criticando a condução do depoimento por um delegado. Ele comparou a investigação à Operação Lava Jato, que, segundo ele, resultou em “danos irreparáveis a pessoas inocentes”.
Apesar das acusações, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) declarou nesta quinta-feira (13) que o ministro “tem o direito de provar que é inocente.”
“Eu acho que o fato do cara ser indiciado não significa que o cara cometeu um erro. Significa que alguém está acusando, e que a acusação foi aceita. Agora, eu preciso que as pessoas provem que são inocentes e ele tem o direito de provar que é inocente. Eu não conversei com ele ainda, eu vou conversar hoje [quinta-feira, 13] e vou tomar uma decisão sobre esse assunto,” afirmou Lula ao desembarcar em Genebra, na Suíça.
A permanência do ministro Juscelino Filho no governo é vista como menos desgastante para o Palácio do Planalto do que sua demissão, que poderia ser interpretada como uma admissão de corrupção. Indicado pelo senador Davi Alcolumbre (União-AP), a decisão sobre sua possível saída também depende do congressista.
A saída de Juscelino Filho forçaria o governo a negociar o cargo com o União Brasil e outros partidos que buscam mais espaço no governo. Lula pode fazer uma reforma ministerial ainda este ano, após as eleições municipais, o que exigiria novas promessas às siglas aliadas e maior fidelidade da base governista no Congresso.
Outros escândalos envolvendo o ministro Juscelino Filho
Após assumir o ministério, Juscelino Filho enfrentou a primeira polêmica ao usar aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) para agendas pessoais, incluindo um leilão de cavalos em São Paulo. O caso gerou uma investigação da Comissão de Ética Pública da Presidência da República (CEP).
O ministro justificou a viagem como “urgente”. Ele deixou Brasília em 26 de janeiro de 2023 e permaneceu em São Paulo até 30 de janeiro de 2023. No entanto, sua agenda no dia 27 durou menos de três horas e terminou ao meio-dia.
Além de usar o avião da FAB, Juscelino Filho recebeu quatro diárias e meia, mesmo com seus compromissos de trabalho encerrados na sexta-feira. Segundo o jornal O Estado de S.Paulo, que revelou o caso, a viagem custou cerca de R$ 140 mil. Os advogados do ministro alegaram que a viagem “se tratava de agenda oficial” e tinha “claro interesse público”.
O caso também foi levado ao Tribunal de Contas da União (TCU), que arquivou a investigação em maio deste ano, concluindo que a viagem de Juscelino Filho em aeronave oficial se justificava pelos compromissos ministeriais. No entanto, ele teve apenas duas horas e meia de agenda oficial. Em julho do ano passado, a Comissão de Ética Pública da Presidência da República também arquivou o processo contra o ministro.
Juscelino Filho foi acusado de embolsar diárias de viagens
Além do uso de aviões da FAB, Juscelino Filho foi acusado de embolsar parte das diárias de viagens domésticas e ao exterior, cumprindo apenas alguns compromissos oficiais, segundo um levantamento do site Metrópoles em julho do ano passado. Ele teria prolongado as diárias de agendas oficiais, marcando compromissos nas sextas-feiras e segundas-feiras para aproveitar o fim de semana no local de destino.
O levantamento aponta pelo menos oito ocasiões em que o ministro teria “esticado” o fim de semana além das agendas oficiais, em viagens a São Paulo, Minas Gerais, Portugal, Espanha, China, Estados Unidos, Suécia, Finlândia e ao Maranhão, seu estado de origem.
Em uma viagem de apenas seis horas a Minas Gerais em junho, considerada urgente, Juscelino Filho recebeu R$ 5,2 mil de ressarcimento e utilizou um avião da FAB para o deslocamento a Belo Horizonte. Segundo a apuração, ele registrou a compra de duas passagens aéreas de R$ 2,4 mil cada, além de uma diária de R$ 299.
Outra viagem a São Paulo rendeu R$ 3 mil ao ministro por quatro diárias e meia, apesar de cumprir agenda oficial em apenas dois dias. Em Portugal, ele recebeu quase R$ 10 mil por quatro diárias com apenas uma reunião marcada.
Na viagem à Espanha, em fevereiro de 2023, Juscelino Filho recebeu R$ 24,4 mil por dez diárias, mas com compromissos oficiais em apenas três dias. Em abril, ele recebeu R$ 82,1 mil de diárias e passagens para acompanhar a comitiva presidencial à China e depois foi para Las Vegas, nos Estados Unidos, para participar de uma feira de comunicação.
Questionado sobre o assunto, o Ministério das Comunicações informou que as viagens “ocorreram dentro da legalidade, uma vez que é levado em consideração um conjunto de fatores, como duração do voo (origem/destino), conformidade com os compromissos oficiais agendados e o fator de adaptação ao fuso horário, que requer um prazo para adaptação da comitiva nos destinos finais.”
Juscelino Filho teria escondido patrimônio do TSE
Em fevereiro de 2023, o jornal O Estado de S.Paulo revelou que o ministro Juscelino Filho deixou de informar ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um patrimônio de pelo menos R$ 2,2 milhões em cavalos de raça na declaração de bens entregue no ano anterior, quando disputou com sucesso a eleição para deputado federal pelo Maranhão.
A investigação do jornal mostrou que, na época em que fez a declaração ao TSE em 2022, Juscelino Filho teria ao menos 12 cavalos da raça Quarto de Milha, adquiridos em leilão. Quando concorreu pela primeira vez a deputado federal, em 2014, ele declarou vários animais. Já em 2018 e 2022, não fez menção a animais.
Em 2022, ele declarou ao TSE um patrimônio de R$ 4,4 milhões, incluindo fazendas, carros, metade de uma aeronave, apartamento e o terreno onde está instalado um haras. Segundo o jornal, esse valor é quase o mesmo que ele teria movimentado em leilões desde 2018, período no qual também teria vendido 14 animais da raça Quarto de Milha. Na época, o ministro foi procurado pela imprensa para esclarecimentos, mas não deu retorno sobre o assunto.
Quem é Juscelino Filho?
Nascido em São Luís, no Maranhão, Jose Juscelino dos Santos Rezende Filho, conhecido como Juscelino Filho, tem 39 anos e é filho do ex-deputado estadual Juscelino Rezende, que também foi prefeito por dois mandatos em Vitorino Freire. O ministro tem outros parentes na política, como a tia Vianey Bringel, ex-prefeita de Santa Inês (MA), e o tio, ex-deputado estadual Stênio Rezende, além da irmã Luanna Rezende, prefeita de Vitorino Freire.
Formado em Medicina pelo Centro Universitário do Maranhão (Uniceuma), Juscelino Filho foi eleito para seu terceiro mandato de deputado federal em 2022, recebendo 142.419 votos. Antes de assumir o ministério, ele foi líder do União Brasil na Câmara. Apesar de estar em um governo petista, ele votou a favor do impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT). “Deus nos abençoe! Vamos aprovar o impeachment!” disse ele em abril de 2016.
Com a volta do PT ao Palácio do Planalto, a indicação de Juscelino Filho foi resultado de um intenso processo de negociação do governo para acomodar o Centrão no Executivo. Inicialmente, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) era cotado para assumir o ministério, mas foi preterido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após acordo com o União Brasil.
Durante o governo de transição, Juscelino Filho foi um dos responsáveis pela articulação da PEC da Transição, que tirou recursos do teto de gastos para viabilizar o pagamento do Auxílio Brasil (atual Bolsa Família) de R$ 600, com o acréscimo de R$ 150 por criança de até seis anos.