Em um artigo publicado neste domingo (30) no jornal norte-americano Wall Street Journal (WSJ), a colunista Mary Anastasia O’Grady afirmou que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, “está usando um registro fraudulento de entrada nos Estados Unidos para manter Filipe Martins atrás das grades”.
Filipe Martins, ex-assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, está preso desde o dia 8 de fevereiro por ordem de Moraes. Ele permanece detido sem denúncia formal, apesar de um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR) favorável à sua soltura, sob a alegação de ter feito uma viagem que nunca existiu.
No artigo do WSJ, O’Grady destaca a confusão em torno de um erro no sistema da Alfândega e Proteção de Fronteiras (CBP), que mantinha um falso registro da entrada de Filipe Martins nos EUA. Esse erro está sendo utilizado por Moraes para justificar a prisão de Martins.
“O registro legal de entrada nos EUA é o formulário I-94, que os viajantes preenchem nos portos de entrada. O CBP removeu o que havia sido postado em seu site, em 30 de dezembro de 2022, [sobre a suposta] entrada de Martins, admitindo implicitamente que algo estava errado. No entanto, a decisão de Moraes continua se apoiando em uma seção separada, ainda a ser corrigida, ‘Obter histórico de viagens’ do formulário I-94 do CBP, que lista a viagem. O que diabos está acontecendo no CBP em Orlando? O equívoco no registro de viagem está sendo usado para violar as liberdades civis do senhor Martins no Brasil. Ninguém no CBP consegue explicar como, por que ou quando foi criado o falso I-94, que fornece convenientemente a narrativa necessária para a prisão”, diz um trecho do artigo.
O’Grady também diz que é “no mínimo, curiosa” a linha do tempo dos acontecimentos e ressalta que o próprio site do CBP destaca que a aba “histórico de viagens” não pode ser utilizada para fins legais.
“Moraes preside uma investigação de uma suposta conspiração do círculo íntimo de Bolsonaro contra o presidente Lula, inaugurada em 1º de janeiro de 2023. Martins foi levado para a prisão em 8 de fevereiro [de 2024]. Dois dias depois, seus advogados souberam que uma lista desatualizada de passageiros do avião presidencial de Bolsonaro para Orlando em 30 de dezembro de 2022 foi usada para sustentar a alegação de que Martins havia fugido ilegalmente do país. Os advogados de Martins no Brasil obtiveram a lista oficial de passageiros do voo de Bolsonaro, que chegou por volta das 22h, e seu nome não constava. A Latam Airlines informou que Martins estava em um voo doméstico no Brasil no dia seguinte, entre Brasília e Curitiba. Nada disso importou Moraes, que quer o suspeito atrás das grades, mas não encontrou nenhum crime”, diz outro trecho do artigo.
Por último, O’Grady relatou uma conversa que teve com Ana Bárbara Schaffert, especialista em imigração baseada na Flórida e uma das advogadas de Filipe Martins. Segundo a colunista do WSJ, Schaffert contou que Alexandre de Moraes não cedeu, mesmo depois de o CBP ter reconhecido que não havia registro de entrada de Filipe Martins nos EUA em dezembro de 2022.
No início de maio, Schaffert pediu ao CBP uma cópia do formulário I-94 de setembro de 2022. Foi quando um funcionário informou que no registro apresentado no site o nome de Filipe Martins estava escrito incorretamente e o número do passaporte era de um documento perdido ou roubado, cancelado em 2021.
A advogada procurou a CBP para informar sobre o erro no sistema. Em vez de remover o registro, a CBP corrigiu o erro ortográfico e substituiu o número do passaporte de Filipe Martins pelo documento atual.
Em seguida, Schaffert procurou um supervisor do CBP e informou sobre a inconsistência no registro de entrada com o nome de Filipe Martins. Uma semana depois, o supervisor respondeu que não poderia fazer mais nada.
A advogada então contatou o Programa de Investigação de Reparação de Viajantes do CBP, anexando as evidências e solicitando uma correção.
Em 5 de junho de 2024, o Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos (DHS, na sigla em inglês) emitiu uma carta informando que o caso estava encerrado.
Schaffert ainda aguarda resposta a um pedido feito via Lei de Liberdade de Informação para correção do “histórico de viagens”, mas ao acessar o formulário I-94, verificou que o registro da entrada falsa com o nome de Filipe Martins havia sido removido. Na sexta-feira (28), segundo a advogada, o caso foi reaberto sem explicação.
Procurada pelo WSJ, a CBP informou que não discute casos individuais e se recusou a comentar.
“Nesta segunda-feira (1º de julho), completam-se 144 dias que Martins está preso injustamente com base em alegações falsas no site do CBP. Seria bom saber como isso aconteceu e por que a agência está tão relutante em corrigir as coisas”, finalizou O’Grady.
Procurada pela reportagem nesta segunda-feira (1º), a advogada Ana Bárbara Schaffert confirmou as declarações ao WSJ e reiterou as críticas ao CBP.