Nos últimos meses, o governo de Putin vem tentando controlar o rap russo “underground”. Apresentações de rappers populares foram repentinamente canceladas.
Após a prisão do popular rapper Husky, em novembro de 2018, a mídia social explodiu com jovens revoltados com o ocorrido. Husky foi preso por doze dias e liberto algumas horas antes de seu concerto, devido a uma forte pressão popular.
Letras de grupos de rap russo, como o El Mashe e Husky ecoam no meio da população jovem da Rússia. Suas músicas contêm textos críticos, que deixam o governo russo de cabelos em pé.
Escrevem sobre a pobreza, a corrupção e a repressão do governo socialista no país.
A atitude de Putin em prender o rapper, ilustra a enorme lacuna entre o governo socialista e os jovens do país.
O governo russo percebeu o quão popular e influente o rap é, e não está sabendo lidar com isso.
O crítico grupo de rap El Mashe enfrentou Putin e disse durante sua apresentação: “Você não pode proibir a música!”.
O presidente Putin acredita que a cultura jovem russa é uma ameaça para o regime vermelho; e tentou adotar as mesmas medidas de seus antecessores soviéticos: controlar e lutar contra a música.
Porém, não foi bem-sucedido.
O governo socialista russo, exerce controle sobre a televisão e está buscando controlar as mídias sociais.
A geração jovem no país, com seus smartphones e canais no YouTube, tem lutado contra a repressão de sua liberdade de expressão.
Há tempo, Putin tem mostrado um relacionamento antagônico com os músicos.
Ao longo da década de 2010, o grupo punk Pussy Riot tornou-se internacionalmente famoso por confrontos com o governo, que resultaram na condenação de dois membros a duras penas de prisão.
Também estão sendo tomadas ações contra artistas de outros gêneros musicais.
Concertos da estrela pop Monetochka e da banda punk Friendzona foram proibidos e tiveram que ser cancelados.
Censura vermelha na música russa
Essa repressão é remanescente da censura das artes da era soviética, quando a música popular ocidental foi proibida e os músicos de rock enfrentaram perseguição.
Nos anos 30 e 40, o famoso compositor Shostakovich foi condenado e processado por Stalin. Stalin queria que os compositores escrevessem músicas otimistas para elogiá-lo e à Rússia.
Quando Shostakovich negou em fazê-lo, ele foi declarado “inimigo do povo” e sua música foi banida.
Na década de 80, o rock foi associado a um “movimento de protesto”.
O governo russo passou a perseguir jovens de cabelos longos e jaquetas de couro, rotulando-os como “viciados em drogas”.
E atualmente, uma geração de jovens artistas, comprometidos com a verdade, ameaça a falsa “imagem ideal do socialismo”, que é passada ao longo das décadas ao povo russo.
Essa nova geração do rap, escreve sobre liberdades, políticas governamentais e oposições ao governo.
Mas a grande diferença com o passado, é que atualmente existem muitos tipos de canais, e o Estado não pode controlá-los, não importa o quanto Putin tente.
A internet é um canal que hoje funciona livremente.
Aleksej, do grupo de rap russo El Mashe, disse em um de seus shows: “Agora eles estão tentando combater os rappers. Para mim, não é mais do que uma repetição da história”.
Popularidade de Putin
Putin não é mais tão popular no seu país, os rappers e os jovens estão cada vez mais expondo suas críticas ao presidente russo, principalmente nas mídias sociais.
O Kremlin percebeu que os jovens não podem mais ser influenciados pela mídia tradicional.
É por isso, que há uma repressão consciente da comunicação entre os jovens, que ocorre principalmente online, mas também no cenário do rap.
O erro da censura
O crítico cultural Andrei Arkhangelskij escreveu em “A Janela na Rússia”, que o governo de Putin, assim como na União Soviética no passado, está cometendo um grande erro ao tentar combater as subculturas musicais populares.
“O governo vê novamente a liberdade de expressão como o maior perigo. Mas como você pode competir com o desejo dos jovens de ouvir música contemporânea?”, afirma Andrei.
Andrei Arkhangelskij é um jornalista russo, colunista e especialista em cultura.
Atualmente trabalha como editor de cultura na revista Ogonyok, parte da editora Kommersant.
Escreveu numerosos trabalhos acadêmicos e jornalísticos sobre a mídia russa. Desde 2014, está envolvido em pesquisa no campo da propaganda da mídia e da ética pós-soviética.
Na Rússia, qualquer um que critique o regime socialista é tratado como uma ameaça à segurança do Estado; e recebe uma bateria de funcionários do governo à porta.
Entre estes funcionários estão, investigadores locais e do departamento especial do Ministério do Interior, e agentes do FSB (sucessor do serviço secreto da KGB).
Rappers conhecidos estão sendo observados e não é inconcebível que até mesmo os próprios seguranças destes, sejam infiltrantes do governo de Putin.
Pois, sabe-se que a nova tática do Kremlin é entrar disfarçado na cultura do rap.
O Kremlin está trabalhando para que todas as áreas na Rússia, inclusive a artística, caminhe na mesma direção de interesse do governo. As autoridades não querem que concertos se transformem em manifestações pela liberdade de expressão.
Nova tática de controle
Depois da tempestade de reações negativas à prisão de Husky nas mídias sociais, o presidente russo Vladimir Putin, pareceu aplicar uma nova tática.
Ele “admitiu” em dezembro do ano passado, que a prisão de Husky não foi inteligente, e que ele queria “colaborar” com os rappers.
Putin reconheceu, que não pode proibir totalmente o rap, mas fará o possível para controlar o gênero. E agora tenta evitar o pior, encapsulando essa cena de rap e mostrando querer “trabalhar” junto aos rappers russos.
“Se não é possível pará-lo, devemos assumir o controle”, disse o presidente em rede de televisão.
Putin pareceu estar “aberto” à discussão sobre sua atitude em relação ao rap, ao falar com assessores culturais em uma reunião em São Petersburgo no final do ano passado.
Segundo o presidente, cancelar concertos e prender Husky é contraproducente. Putin propõe, portanto, que o Kremlin desempenhe um papel de liderança na música rap e na cultura jovem.
A tática de Putin é incluir os jovens entre seus seguidores. O presidente decidiu permitir que os “bons” rappers apareçam na mídia estatal.
Certamente, isso não trará resultados positivos para o governo russo. Pois, graças à mídia independente, uma nova geração russa está adquirindo conhecimento da realidade e formando um espírito crítico, capaz de discernir o mal aplicado em sua sociedade.
Esta nova tática do Kremlin, apenas se encaixa perfeitamente na imagem real do socialismo, que busca uma geração jovem controlada. Aliás, não só de jovens, mas de toda a população.
Mera semelhança encontrada neste artigo com governos vermelhos anteriores do Brasil , é a mais pura coincidência!