A produção de petróleo no Brasil vem crescendo e deve atingir seu pico em 2029, com um volume médio de 5,4 milhões de barris por dia, consolidando o país entre os dez maiores produtores e exportadores do mundo – atualmente, o Brasil ocupa a 9ª posição em ambos os rankings. No entanto, sem novas descobertas, o país pode se tornar um importador líquido de óleo bruto na próxima década.
Atualmente, o Brasil importa petróleo não por insuficiência de produção local, mas para compor o “mix” de óleos processados nas refinarias, enquanto exporta parte do que produz. De janeiro a maio, o Brasil exportou US$ 25,9 bilhões em óleo e importou US$ 10,5 bilhões, conforme dados do Ministério do Desenvolvimento.
O futuro pode trazer a necessidade de importação por escassez de petróleo nacional, marcando o fim da autossuficiência.
As projeções da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) indicam que a produção nacional de petróleo no Brasil deve cair para 5,3 milhões de barris por dia em 2030. No ano seguinte, a produção deve ser de 5,2 milhões, e em 2032, de 4,9 milhões de barris diários. Essas estimativas fazem parte do Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2032, da EPE.
Atualmente, o Brasil produz uma média de 3,2 milhões de barris por dia, conforme dados de abril da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). As reservas provadas, ou seja, comercialmente viáveis, somam 15,89 bilhões de barris, dos quais 12,56 bilhões estão no pré-sal, segundo os dados mais recentes de 2023.
Segundo José Mauro Coelho, ex-presidente da Petrobras e presidente da Aurum Energia, indicadores do setor mostram que, se o Brasil continuar com as atuais reservas e a mesma produção, tem petróleo para mais uns 15 anos.
“O desafio é incorporar novas reservas e ir aumentando [a produção]. Se não desenvolver esse potencial, o Brasil, que é autossuficiente, pode a partir de 2030 voltar a importar”, afirma Coelho, referindo-se às potenciais novas províncias petrolíferas do país: a Margem Equatorial, no litoral norte, e a Bacia de Pelotas, na costa sul.
Margem Equatorial aguarda licença ambiental há mais de uma década
A Bacia de Pelotas foi leiloada no 4º ciclo da oferta permanente de concessão da ANP, realizado em dezembro, sendo uma das apostas para revitalizar o setor de petróleo no Brasil. No entanto, a maior expectativa está na Margem Equatorial, com potencial estimado de ao menos 10 bilhões de barris de petróleo recuperáveis, quantidade comparável ao atual volume do pré-sal.
Enquanto a Bacia de Pelotas é uma aquisição recente, os blocos para exploração na Margem Equatorial aguardam licenciamento ambiental há anos, tendo sido licitados há mais de uma década. A preocupação do setor é o tempo, já que projetos petrolíferos exigem investimentos significativos e demoram para ser executados, especialmente devido à complexidade das operações em alto-mar.
Por isso, governo e Petrobras estão se esforçando para obter do Ibama a licença para pesquisas na Margem Equatorial. Além da resistência do órgão ambiental em liberar a exploração na área, surgiu agora um complicador: os servidores do Ibama aprovaram uma greve em pelo menos dez estados, o que ameaça atrasar ainda mais os licenciamentos.
Em entrevista ao Blog Desenvolvimento no ano passado, antes de assumir a presidência da Petrobras, Magda Chambriard já havia expressado preocupação com o pico do pré-sal:
“[O campo de] Tupi já está em declínio há pelo menos dois ou três anos. Ao final do desenvolvimento [do campo] de Búzios, creio que esse pico já será ameaçado. E qual será a alternativa da Petrobras e do Brasil sem um novo play?”, questionou, acrescentando: “Seria extremamente decepcionante chegar ao pico do pré-sal sem alternativa de compensação”.
Em sua primeira entrevista como presidente da Petrobras, Magda Chambriard enfatizou a necessidade de manter e acelerar os esforços exploratórios da empresa: “Temos que tomar muito cuidado com a reposição das reservas, a menos que a gente queira aceitar o fato de que podemos voltar a ser importadores, o que para mim está fora de cogitação”.
A estimativa é que, se as reservas de Pelotas e da Margem Equatorial forem incorporadas, a produção de petróleo pode prolongar a autossuficiência nacional em mais de 30 anos. Segundo José Mauro Coelho, da Aurum Energia, isso daria tempo suficiente para fazer a transição energética para outras fontes, um processo que já se provou ser lento.
Especialistas do setor de óleo e gás, incluindo José Mauro Coelho, argumentam que a transição energética não é tão rápida quanto se gostaria ou imaginava. Segundo eles, ainda levará algumas décadas para que outras matrizes energéticas consigam absorver a demanda atualmente suprida pelo petróleo, seja na produção de energia ou como matéria-prima para produtos. Portanto, se não houver expansão na exploração, a importação será inevitável.
O problema da importação, afirmam, é que o óleo custará mais caro. Além disso, há um efeito dominó, já que o petróleo é insumo para várias indústrias. Na prática, comprá-lo de outros países pode encarecer desde o combustível e a energia até produtos fabricados a partir dele, como plástico e derivados.
Ou ainda, como diz uma fonte, isso pode refletir na falta de investimentos em outras áreas, como saúde e educação. Além disso, uma queda na produção significaria menos royalties e impostos, levando o governo a se sentir tentado a intervir nos preços, como aconteceu em décadas passadas. Nos anos 1980, o país criou a “conta-petróleo”, um mecanismo no qual o governo compensava a Petrobras pela diferença de preço do petróleo importado.
Em nota, a Petrobras informou que “reforça a importância da reposição de reservas e, com isso, a necessidade de exploração de novas fronteiras. Sempre tendo como valor o respeito à vida, às pessoas e ao meio ambiente”.
Em um artigo para o site Brasil Energia, em 2023, Magda Chambriard escreveu que é crucial “estar mais preparado para enfrentar o desafio do licenciamento [ambiental] tempestivo, sob pena de condenar o Brasil à estagnação”.
“Não é crível que após 10 anos da oferta pública da Margem Equatorial e décadas de operação na Bacia de Campos, ainda haja impasses técnicos em processos de licenciamento. Ou se faz isso agora, ou esse impacto continuará colocando em risco todos os projetos de infraestrutura carentes de licenciamento federal e elevando significativamente o Custo Brasil”, apontou.
Ibama não autoriza busca por petróleo na Margem Equatorial do Brasil
Pelotas é uma descoberta recente. Em contraste, os 142 blocos em 11 bacias na Margem Equatorial foram adquiridos em 2013, durante a 11ª Rodada de Licitações. O leilão atraiu 71 empresas, das quais 30 adquiriram blocos, sendo 18 estrangeiras. Elas pagaram um total de R$ 2,48 bilhões em bônus de assinaturas para investir em bacias como Barreirinhas, Ceará, Espírito Santo, Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Parnaíba, Pernambuco-Paraíba, Potiguar, Recôncavo, Sergipe-Alagoas e Tucano.
A obtenção de licenças ambientais, no entanto, tem sido um grande obstáculo, levando muitas empresas a desistirem dos blocos. A Petrobras, porém, continua tentando obter a liberação para explorar petróleo na região, especialmente na bacia da Foz do Amazonas.
A Margem Equatorial é a área mais cobiçada e sensível. Lá se espera encontrar o maior volume de petróleo, mas, como o nome sugere, é a região mais próxima do rio Amazonas, abrigando uma vasta biodiversidade e comunidades indígenas e ribeirinhas.
Essa situação gerou um cabo de guerra no governo Lula, com a Petrobras e ministros da área econômica de um lado, e o Ibama e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, do outro. Marina e sua equipe não têm pressa nem interesse em permitir a perfuração na região.
Integrantes do Ministério do Meio Ambiente já afirmaram publicamente que a questão só deve ser resolvida após a COP 30, conferência do clima que será realizada no fim de 2025 em Belém do Pará, próximo à Foz do Amazonas.
Enquanto isso, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, pressionando pelo licenciamento ambiental, chegou a afirmar que a Guiana estaria “chupando de canudinho” as riquezas do Brasil. A economia guianense é uma das que mais crescem no mundo, graças à produção de petróleo em sua costa, que tem características geológicas semelhantes às da Margem Equatorial brasileira.
O Ibama informou que este ano enviou à Petrobras um ofício indicando a necessidade de realizar levantamentos requeridos pela Funai para uma adequada avaliação dos impactos sobre os povos indígenas da região do Oiapoque (AP). Até o momento, segundo o instituto, a Petrobras não respondeu ao ofício.
A Petrobras afirmou que ainda aguarda a resposta do Ibama a um pedido de reconsideração protocolado em maio de 2023, após o órgão negar a emissão da licença. Segundo a empresa, a resposta do Ibama permitirá a definição das próximas ações e a continuidade do processo de licenciamento ambiental.
“A companhia segue empenhando todos os esforços na obtenção da referida licença e avalia que todos os estudos e exigências solicitadas pelo Ibama, no âmbito do licenciamento ambiental e conforme a legislação de regência, foram atendidos pela empresa, assim como está aberta a incorporar novas solicitações que se façam necessárias”, disse a estatal em nota.
Visões de ambientalistas e petroleiros sobre exploração de petróleo na Margem Equatorial
Em ocasiões anteriores, representantes do Ibama afirmaram que os estudos apresentados pela Petrobras não eram suficientes para garantir que, em caso de vazamento, a população e a região estariam seguras. Movimentos ambientais, como o Greenpeace, conduzem pesquisas paralelas que indicam que um vazamento poderia ser nocivo.
Por outro lado, players do mercado de óleo e gás asseguram que a exploração é segura, como ocorre em outros estados, e que o risco de vazamento é mínimo. Além disso, garantem que a Petrobras está preparada para contornar qualquer incidente.
José Mauro Coelho, da Aurum, destaca o argumento econômico. Ele afirma que a indústria do petróleo tem uma cadeia longa para geração de emprego e renda e pode contribuir significativamente com a arrecadação de royalties para as regiões Norte e Nordeste. “Tem um grande potencial de desenvolvimento econômico para a região. Por que abrir mão de tudo isso?”, questiona.