Imagem: Divulgação | Conexão Política
Este artigo é uma versão editada e mais completa de um texto publicado em 3 de julho de 2018 no meu perfil pessoal do Linkedin.
Como o tema imigração pra Portugal está na moda no Brasil nesse momento – o que está diretamente relacionado aos modelos políticos e sociais implantados nos últimos 33 anos de Governos de Esquerda que levaram nosso país ao caos que se encontra – achei interessante dar uma nova roupagem no conteúdo além de fazer paralelos às situações econômicas e sociais que aproximam ou distanciam Brasil e Portugal.
A quem interessa esse artigo e o que eu espero transmitir
Nesse artigo falo um pouco sobre a importância de distinguir material publicitário de fonte 100% fiável de informação; eu menciono a posição econômica de Portugal, frete aos seus pares da União Européia; falo sobre o boom no mercado imobiliário de Portugal dos últimos 2 anos e, como sempre, alerto para os riscos de confiar no Governo (principalmente nos Governos com administrações de esquerda, o que é o caso de Portugal).
Imagino ser de interesse, principalmente dos brasileiros que pensam em Imigrar pra Portugal e investir no Mercado Imobiliário como forma renda ou subsistência.
Há muitas informações vagas, incorretas ou imprecisas sobre Portugal nesse momento e eu, como imigrante aqui na terrinha, penso que posso ajudar algumas pessoas a clarear a visão e alertar que nem tudo é um mar de rosas por aqui.
Esse artigo se resume a um tema específico e, se houver interesse no assunto, pode ser que eu dê os meus pitacos em outros assuntos relacionados à imigração pra Portugal ou a como eu vejo a vida cotidiana em Portugal nesse momento. Outros artigos nesse segmento dependem apenas do interesse da audiência. Utilizem os comentários se para sugerir algum tema relacionado a imigração pra Portugal.
O artigo do Marcio Fenelon
Li um artigo do Márcio Fenelon, compartilhada num grupo de amigos interessados em Portugal, sobre a existência ou não de uma bolha imobiliária no mercado português e resolvi comentar alguns pontos – não necessariamente afirmando ou negando a existência de uma bolha, o que seria puro exercício de especulação – mas sim tentando contrapor os argumentos utilizados para defender que o mercado português está saudável e que há evidências de previsibilidade de continuidade do ciclo positivo, o que discordo frontalmente.
Desde já, saibam que eu acompanho o trabalho do Márcio Fenelon desde a época de Money Academy e fui cliente dele na Empiricus Brasil. Dessa forma, afastem qualquer tipo de impressão de pessoalidade nas críticas. Acho importante a análise independente do interlocutor e quando respeitamos o gabarito deste interlocutor, o exercício fica muito mais interessante e cuidadoso.
Além do mais, do pouco conhecimento que tenho da área, grande parte veio justamente do vasto material publicado pelo próprio Márcio na época que ele assinava o relatório “Valor imobiliário” da Empiricus do Brasil (atualmente assinado pelo competentíssimo Daniel Malheiros). Longe de mim subestimar as análises de um dos maiores nomes do research imobiliário do Brasil, entretanto a artigo comentado, no meu entendimento, é mais uma peça publicitária do que, de fato, um relatório isento de vieses.
Do mais, existir ou não uma bolha é apenas detalhe desde que você saiba o que de fato está acontecendo e calcule todo os riscos envolvidos (pelo menos todos que você conseguir mapear), pois até nas bolhas dá para se ganhar dinheiro, ou não dá? Conhecer os riscos do setor é fundamental para investir certo.
Eis aqui o link para o artigo do Márcio Fenelon:
Premissas
Grande parte dos fundamentos que levanto aqui sobre o cenário atual português advém do relatório assinado “Uma verdadeira bolha imobiliária se formou” publicado em 10 de maio de 2016 pela Empiricus do Brasil e assinado pelo próprio Márcio Fenelon. Nesse relatório há uma crítica sobre a supervalorização dos imóveis em Vancouver, no Canadá, e a justifica que por lá havia (ou há) uma bolha imobiliária em formação devido a características bem semelhantes às que temos em Portugal no momento.
Por questões de disclaimer, não posso e nem devo reproduzir o relatório aqui, mas posso resumir que a base para justificar a tal bolha na ocasião era:
- A forte imigração e lavagem de dinheiro proveniente de chineses fugindo da China comunista, o que é análogo à máfia de concessões de vistos Gold de Portugal e a imigração massiva de europeus e brasileiros;
- Desvalorização da moeda em relação ao dólar americano, facilitando a entrada de dinheiro estrangeiro. O mesmo acontece com o Euro em relação ao Dólar nesse momento;
- A perda do poder de aquisição dos nativos canadenses devido aos altos custos provenientes do ciclo de alta. Exatamente o que acontece em Portugal nesse momento.
O caso canadense ainda oferece graus de sustentabilidade até superiores ao português, pois os chineses compram os imóveis à vista e não recorrem ao crédito bancário.
Apesar de ainda não ter estourado, há características claras de uma bolha em formação em Vancouver e o Márcio parece ser acertado em cheio em 2016:
Para quem não sabe, o crédito de forma geral nos países Europeus, é indexado pela Euribor (semelhante à nossa taxa SELIC) e, nesse momento que escrevo, encontra-se em patamares negativos.
Trocando em miúdos, a situação na Europa é tal, que o crédito (inclusive os soberanos) é subsidiado com intuito de incentivar a demanda (Keynesianismo puro).
Atenção Ciro Gomes: Políticas anticíclicas não funcionam no longo prazo principalmente porque no longo prazo as grandes crises são inevitáveis.
Se alguma crise de proporções acentuados abalar o Mundo ou a Europa nesse momento, os países mais endividados (veremos que Portugal é um deles no caso Europeu) são os primeiros a afundar.
Por que em Portugal seria diferente de Vancouver?
“A crise do subprime foi a maior bolha de imóveis. O descolamento dos fundamentos foi resultado do relaxamento na concessão de crédito e posterior esgotamento da capacidade de pagamento.”
A taxa de juros responsável pela dosagem de crédito do mercado português está há anos sendo subsidiada de forma keynesiana pelo BCE. Se isso não é relaxamento na concessão de crédito, não sei o que é.
Sem prêmio de risco justo devido ao incentivo Estatal à demanda, toda a cadeia produtiva fica exposta a riscos imprevisíveis de crédito.
“No longo prazo os preços dos imóveis são determinados pela renda global dos usuários. Quando o PIB e a população ativa crescem, a renda global sobe, assim como os aluguéis e o preço dos imóveis.”
Concordo 100% com esse trecho. O problema é que ele contradiz todo o restante do artigo.
O PIB português está completamente descolado dos pares fronteiriços, sendo o segundo que menos cresce na União Europeia e, segundo previsões, até 2023.
“Uma bolha em imóveis pode acontecer quando há muito crédito, muito barato e por prazos alongados concedidos sem critério para pessoas que não conseguem posteriormente honrar o compromisso.”
Também concordo 100%. Em Portugal há muito crédito, é barato e pode ser alongado por até 40 anos.
Os maiores defensores de que não há uma bolha imobiliária em Portugal, são justamente os bancos, as grandes imobiliárias e os researchs dependentes do mercado imobiliário. Isso porque eles estão faturando sobre um cenário de risco supostamente baixo, visto que a origem do dinheiro que paga os spreads bancários, comissões de vendas e relatórios de análises não é o português.
Ninguém consegue prever de onde vem nem quando virá a próxima crise na zona do Euro, mas que ela virá, virá. Quando esse famigerado momento chegar, certamente vai fazer secar a fonte desse “dinheiro barato dos gringos” e os casos de inadimplência devem começar a disparar causando um efeito cascata de proporções apocalípticas paro o sistema bancário detentor de dívidas.
Veja a incoerência clara nesta matéria:
“O descolamento dos fundamentos fica claro quando os compradores começam a falhar nos pagamentos de prestações e aluguéis. É o momento de vendas forçadas e da inadimplência, que derruba os preços abaixo dos fundamentos.”
Discordo veementemente. O descolamento dos fundamentos fica claro muito antes dos compradores falharem nos pagamentos. Pode ser observado, entre outras coisas, por uma tendência negativa de concessão de crédito, diminuição de concessão de crédito para determinados segmentos da sociedade, quando a taxa de imóveis financiados e desocupados aumenta, etc.
Olhar apenas para o cumprimento das obrigações é olhar apenas para o efeito a posteriori do descolamento de preços e não para a causa do descolamento. A própria bolha subprime comprova isso. Quando começaram os incumprimentos de obrigações, todo sistema bancário de crédito já estava comprometido.
Os sinais de descolamento vêm muito antes e sempre acompanhado de um “dessa vez é diferente” ou algo semelhante.
De julho de 2018 quando esse artigo original foi escrito, até agora, quando ele foi atualizado, só pra citar alguns exemplos:
- A taxa de cambio Real X Euro disparou freando o movimento de imigração brasileira pra Portugal e aumentando os estoques de imóveis, mesmo que ainda seja pouco relevante na formação de preços;
- O BC Português normatizou regras muito mais restritivas na concessão de crédito habitação, como por exemplo, limite de tempo máximo de 50 para 40 anos;
- O Governo Socialista Português está tão desesperado para trazer gente e grana pra Portugal que hoje, 26 de agosto de 2018, o Primeiro Ministro António Costa anunciou que o Governo, ou seja, os contribuintes pagadores de impostos, vão subsidiar por 5 anos 50% do Imposto de Renda dos portugueses que emigraram de Portugal e que desejam voltar.
- Como fica claro, governos Socialistas não hesitam em usar o seu, o meu, o nosso dinheiro quando tem a corda no pescoço.
- Governos Socialistas dificilmente resolvem os problemas na raiz. Ao invés que incentivar os portugueses emigrantes a voltar pra Portugal através de políticas austeras que permitissem reduzir a dívida pública – desregulando o mercado, desburocratizando os negócios, enxugando a máquina pública e investindo onde, de fato, precisa investir de forma a permitir que os empresários e empreendedores criem riqueza através de empregos e renda – prefere roubar o dinheiro dos contribuintes para se reeleger com medidas populistas. Qualquer semelhança com nosso passado recente, não é mera coincidência.
“Embora os aluguéis e os preços dos imóveis já estarem em patamares inacessíveis em determinadas regiões para grande parte da população portuguesa, ainda são até baratos para o padrão do cidadão europeu.”
Dois pontos aqui: Primeiro, já se observa que os nativos com faixas de renda normal pros padrões de Portugal já estão sendo afetados o que é claramente um dos tais efeitos de descolamento de fundamentos.
Segundo: O preço dos imóveis não pode ser comparado com outros países sem levar em consideração o PIB/per capita de cada país. É uma insanidade comparar o preço do m2 de Lisboa com o preço do m2 em Paris sem levar em consideração a gritante diferença de renda entre as populações de ambos.
“Imóveis nas regiões prime de Lisboa, Porto e Algarve são acessíveis para residentes da Inglaterra, França, Suíça, Alemanha, Holanda, Bélgica, Áustria, entre outros.”
Os imóveis em Lisboa são acessíveis para a maioria dos moradores de outros países da Europa, exceto Grécia e, imaginem só, Portugal!
A maioria dos nativos portugueses não tem condições nem de pagar uma renda no centro de Lisboa. Existem regiões mais ao Sul de Portugal, Algarve, por exemplo, que a renda está tão alta que postos de trabalho estão ficando desocupados porque não compensa para um nativo pagar uma renda de 700, 800 euros pra ganhar uma salário mínimo de 600 euros.
“O turista europeu ainda considera Portugal uma verdadeira pechincha, sendo Lisboa a segunda capital mais barata da Europa para viajar.”
Existem dezenas de outros países mais baratos que Portugal para viajar e turistar. Isso não quer dizer absolutamente nada para a análise de mercado imobiliário e não há nenhuma relação direta entre turismo e pujança imobiliária.
“O morador local não consegue mais comprar imóveis nos grandes centros, porém a dinâmica de atração de aposentados e turistas europeus justifica com sobra os preços que estão sendo praticados.”
É fato que o morador não compra mais imóveis nos grandes centros. Ele também já não arrenda mais e, em casos não muito raros, são praticamente despejados de sua moradia ou apartamento quando a vigência do contrato termina.
Os empresários de diversas áreas urbanas e turísticas de Portugal também começam a parar de investir devido aos altos custos imobiliários de compra e construção.
Com relação ao aposentados e turistas europeus movimentando o mercado, basta uma alteração legislativa para sobretaxar imóveis vazios para derrubar o setor. Nunca confie no Estado!
O parágrafo acima foi escrito em julho de 2018. Desde dia 1 de agosto de 2018, mais de 20 municípios de Portugal, passaram a taxar na alíquota máxima de 4,5% do valor patrimonial do imóvel, o IMI (é a versão portuguesa do IPTU que, como no Brasil, só serve para fazer a tal distribuição de riqueza, roubando de todos os proprietários de imóvel para gastar com a máquina pública) as moradias e apartamentos vazios por mais de 1 ano.
Parecia que eu estava adivinhado, mas não é vidência nem sensitividade. Quem conhece um pouquinho que seja os modelos esquerdistas de administração pública, não se surpreende com inovações legislativas com objetivo de roubar o seu rico dinheirinho.
“Do ponto de vista dos fundamentos econômicos, os preços estão em linha com prêmios de retorno que devem ser exigidos pelo risco de investir em um imóvel. Os yields ainda são muito atraentes, sendo superiores às alternativas financeiras e aos outros mercados imobiliários europeus.”
Discordo demais desse ponto. Os preços absurdamente altos dos imóveis nos grandes centros portugueses só estão em linha com os prêmios de retorno, porque os prêmios de retorno estão absurdamente altos também. Está tudo baseado numa premissa de que o movimento imigratório é constante e sustentável.
Na minha opinião, olhando um pouco da história documentada do Mundo, nenhum movimento migratório é constante e muito menos sustentável.
“Não há nenhum indício de descolamento dos fundamentos. O que temos em Portugal é um bull market e não uma bolha. Não é um ambiente para ter uma ruptura repentina de preços.”
Toda bolha antes de estourar é considerada um bull market.
“O medo é bom porque conserva os dentes, mas atrapalha quando se baseia em notícias superficiais. O fato dos imóveis subir muito, por si só não quer dizer muita coisa. O investidor inteligente vai buscar se as razões do aumento são sustentáveis. ”
Concordo 100%. Só não acho que os aumentos dos últimos anos sejam sustentáveis para o médio-longo e prazos.
“Por mais que a mídia diga o quão ridículo os preços estão, enquanto a demanda for sustentável e a oferta de novos imóveis não for exagerada, não há razão para ficar fora de um mercado que só sobe.”
Essa frase é a versão atual para o “dessa vez é diferente”.
Concluo dizendo que, apesar de não compartilhar do cerne da questão levantada, conforme já tive a oportunidade de conversar pessoalmente com alguns de vocês, eu realmente acredito que há muitas oportunidades no mercado imobiliário em Portugal, principalmente no segmento de baixa renda (médio e longo prazo) e m2 comercial (longo e longuíssimo prazo). Contudo, discordo da corrente que acredita que estamos vivendo um ciclo sustentável de mudança do paradigma econômico-social aqui na terrinha.
Do mais, recomendo fortemente que busquem mais informações sobre relatórios do Márcio Fenelon e da “Quaest Europa” e, se quiserem, os assinem. Certamente no conteúdo pago, os insigns serão muito mais detalhados, os riscos explicitados e o embasamento das informações muito mais firme. O Márcio Fenelon é uma tremenda autoridade no que tange o tema de investimento imobiliário (talvez a maior do Brasil e de Portugal), mas não confundamos material publicitário como research independente.
Se você quiser um exemplo atual de como jamais devemos confiar cegamento no Governo, recomendo a leitura do meu artigo “Criando crises e acumulando poder”. O link segue:
https://conexaopolitica.com.br/artigo/criando-crises-e-acumulando-poder/