Enquanto o papa Francisco critica os males da exploração sexual na Tailândia, o Vaticano é acusado de abrigar um bispo procurado por supostos crimes de abuso sexual.
Promotores na Argentina emitiram um mandado de captura internacional para o bispo Gustavo Zanchetta, acusado de abusar sexualmente de jovens padres seminaristas. Ele nega as acusações.
O bispo Zanchetta, 55 anos, que é próximo ao seu papa argentino Francisco, vive no Vaticano. Ele reside na Casa Santa Marta, um bloco de acomodações à sombra da Basílica de São Pedro, onde Francisco vive desde sua eleição, há seis anos.
Os promotores argentinos reclamaram que o bispo não respondeu a repetidos e-mails e telefonemas sobre as alegações de abuso, que foram feitas no ano passado por dois jovens seminaristas. Os padres seminaristas também o acusaram de má gestão das finanças da diocese e abuso de poder.
Se condenado, o bispo pode pegar até 10 anos de prisão. No entanto, não há um tratado de extradição entre a Argentina e o Vaticano e, por enquanto, ele parece estar abrigado com segurança em Roma.
O impasse surgiu quando o Papa Francisco fez um discurso em Bangcoc, na Tailândia, em favor das vítimas de tráfico sexual, provocando acusações de um duplo padrão na posição da Igreja Católica sobre crimes sexuais.
“Apesar de suspenso do ministério, o Vaticano argumentou que o ‘trabalho diário’ de Zanchetta exige que ele esteja em Roma, em vez de ser julgado na Argentina. Essa decisão é, na melhor das hipóteses, questionável e, na pior das hipóteses, uma oportunidade patrocinada pelo Vaticano para Zanchetta escapar da justiça”, disse Zach Hiner, diretor executivo do grupo de pressão das vítimas SNAP, a Rede de Sobreviventes dos Abusos de Sacerdotes.
“Se o Papa Francisco levasse a sério sua batalha total contra casos de abuso do clero, ele ordenaria que Zanchetta retornasse à Argentina e enfrentasse as acusações contra ele”, concluiu Zach Hiner.
Anne Barrett Doyle, do BishopAccountability.org, que documenta a crise de abuso na Igreja Católica, informou que é vital que o Papa Francisco garanta a total cooperação de Zanchetta com as autoridades civis argentinas. Fazer o contrário colocaria o Papa em violação de seu próprio decreto que proíbe a conduta de bispos que interferem nas investigações civis.
“Francis deve começar a dar o exemplo – especialmente porque sua proteção de Zanchetta até o momento levanta questões perturbadoras sobre seu compromisso de acabar com a cumplicidade por parte dos funcionários da Igreja. Em primeiro lugar, Francisco não deveria ter dado a Zanchetta um porto seguro, considerando as irregularidades relatadas pelo bispo na Argentina”, disse Anne Barrett Doyle.
Durante uma missa ao ar livre em na capital tailandesa de Bangcoc, no início deste mês, o papa pediu maiores esforços no combate ao que chamou de “humilhação” de mulheres e crianças forçadas à prostituição.
Antes, em um discurso proferido no gabinete do primeiro-ministro tailandês, o papa pediu um maior compromisso internacional para proteger mulheres e crianças “que são violadas e expostas a todas as formas de exploração, escravização, violência e abuso”.
Em 2017, Zanchetta renunciou ao cargo de bispo da cidade de Oran, no norte da Argentina, citando “razões de saúde”.
O papa o chamou para Roma e lhe deu um emprego na APSA, a agência do Vaticano que administra o enorme portfólio de propriedades da Igreja.
Em janeiro, ele foi suspenso desse papel, com o Vaticano reconhecendo que estava sob investigação.
Os promotores argentinos reclamam que não conseguem entrar em contato com Zanchetta e que ele se recusa a responder às suas comunicações.
O Vaticano também não respondeu a perguntas sobre o paradeiro de Zanchetta ou se ele pretendia responder aos promotores na Argentina.
Em uma entrevista na televisão mexicana no início deste ano, o papa disse que havia perguntado a Zanchetta sobre as acusações, que envolviam selfies de nudes no celular do bispo. Francisco disse que deu a seu amigo o benefício da dúvida depois que ele alegou que seu telefone havia sido hackeado.
Um representante do bispo em Roma insistiu que Zanchetta sempre havia cooperado com os investigadores.
“Ele é o primeiro a se interessar em esclarecer a verdade, para que sua reputação possa ser restaurada. Por esse motivo, ele continuará a cooperar ativamente com o sistema judiciário”, disse Javier Iniesta à Reuters.
O papa Francisco foi acusado de não agir contra o flagelo do abuso sexual por parte de grupos de campanha que representam vítimas.
Escândalos surgiram na Argentina e no país vizinho Chile, além de outros países como Irlanda, Austrália e Alemanha.
=